Corinthians decide correr risco com ação cautelar para tentar blindar contas e renegociar dívidas
Por Tiago Salazar
São Paulo, SPO objetivo da ação é blindar as contas bancárias do clube. Uma eventual aceitação da Justiça vai acarretar em suspensão das execuções de cobrança e de bloqueios de receita por 60 dias, período que o Corinthians pretende usar para negociar com seus credores as dívidas do âmbito civil e trabalhista que têm vencimento em curto prazo, ou seja, que devem ser honradas em até, aproximadamente, quatro meses, e que hoje, somadas, representam cerca de R$ 200 milhões.
A diretoria corintiana entende que os bloqueios e as execuções de dívidas têm travado o caixa do clube e impedido qualquer plano para pagamentos. Este é o principal argumento para a decisão de entrar com a ação cautelar, uma medida que tem poder para dar fôlego ao caixa e tempo aos dirigentes.
Caso a solicitação seja aceita pelo juiz, o Corinthians, após o período de 60 dias e de todas as negociações feitas nele, deverá fazer um aditamento indicando o rumo que pretende tomar. Isso pode implicar em uma tentativa de Recuperação Judicial, ou de uma Recuperação Extrajudicial. Entretanto, não está descartado, também, a retomada das atividades normais, dependendo, principalmente, do andamento do plano de usar um fundo imobiliário para vender parte das cotas da Neo Química Arena ao mercado, projeto da gestão Duilio Monteiro Alves que foi estruturado pela KPMG e que, nas últimas semanas, foi resgatado pela atual diretoria.
A reportagem apurou que o clube pretende explicar ao público, de maneira oficial, a intenção e os motivos da ação cautelar, junto a prazos, valores e credores. Essa satisfação está prevista para acontecer tão logo os documentos sejam protocolados e o pedido realizado.
RISCO DA AÇÃO
Ao tomar o caminho da solicitação de ação cautelar, o Corinthians decidiu, também, assumir um risco, que é a Justiça negar a solicitação.
Neste caso, o clube pode sofrer um forte dano reputacional no mercado e, mais grave que isso, uma avalanche de execuções de seus credores, algo que travaria completamente as operações financeiras.
A movimentação por uma ação cautelar tende a elevar a tensão de quem tem a receber do Corinthians e, naturalmente, leva ao receio de que o clube tente uma recuperação judicial na sequência.
Neste cenário, credores, em massa, podem executar dívidas de maneira simultânea, a fim de garantir que vão receber antes de qualquer nova tentativa do clube em paralisar os pagamentos e abrir negociações.
Essa possibilidade foi discutida internamente, e a decisão da gestão foi de assumir o risco, confiando que a Justiça concederá a liminar para uma ação cautelar. Por isso, aliás, o Corinthians vai registrar o pedido com uma finalidade de "mediação" e não de "recuperação". A intenção é justificar ao juiz a inviabilidade de fazer os pagamentos na situação atual e, portanto, a necessidade da ação cautelar para renegociar com credores.
CONFLITO DE INTERESSES
Fred Luz, consultor executivo do Corinthians, contratado em julho por meio da empresa Alvarez & Marsal, é o principal entusiasta da ideia do clube assumir o risco e dar entrada no pedido de ação cautelar na Justiça. Internamente, Fred foi peça-chave para convencer dirigentes e acelerar departamentos para que o plano fosse colocado em ação.
A Gazeta Esportiva apurou que a situação tem gerado desconfortos dentro do Parque São Jorge, pois, caso a ação cautelar seja aceita pela Justiça, a própria Alvarez & Marsal é quem ficará responsável pelas negociações com os credores e, por contrato, a empresa tem direito a porcentagens variáveis a cada sucesso com cada credor do Corinthians, individualmente, além de um ganho fixo, mensal.
Portanto, fica claro que, para a Alvarez & Marsal, é interessante o Corinthians entrar com ação cautelar ou, quem sabe, uma recuperação judicial em um futuro breve. Estes trabalhos são especialidades da empresa e garantem receitas elevadas para a mesma.
Fred Luz é sócio da Alvarez & Marsal e, inclusive, se recusou a se desvincular da empresa para se tornar CEO (Chief Executive Officer ou Diretor Executivo) do Corinthians. O clube, então, contratou a A&M, que, por sua vez, indicou Fred para o cargo executivo no clube. Desta maneira, Fred Luz concentrou poderes que podem ser interpretados como conflitantes neste caso.
CONSELHO DE FORA
O Conselho Deliberativo está atento aos passos da gestão. A reportagem apurou que Romeu Tuma Júnior, presidente do órgão fiscalizador, enviou um ofício à diretoria executiva e pode convocar os Conselheiros para uma reunião nos próximos dias a fim de discutir a decisão tomada pelo presidente Augusto Melo, feita sem qualquer consulta ao órgão. Há uma discussão sobre a necessidade da anuência do CD antes de uma ação que envolva um alto grau de risco ao clube, como é o caso do pedido de ação cautelar.
NEGOCIAÇÃO NA CBF
O pedido de ação cautelar na Justiça não vai abranger as dívidas do Corinthians com atletas, agentes e clubes de futebol.
O Timão tem cerca de R$ 85 milhões registrados e julgados na CRND (Câmara Nacional de Resolução de Disputas) da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), todos referentes a disputas desportivas.
Para resolver estas pendências, membros da diretoria corintiana se reuniram com os responsáveis pelo painel do tema, na CBF. O clube apresentou números, explicou a situação e ficou de preparar um plano de pagamento, que terá de ser apreciado por este painel da CBF.
O Corinthians pretende apresentar uma proposta viável, dentro da realidade financeira do clube, e, neste caso, só vai precisar da concordância da Confederação. Os credores não têm poder de veto da proposta.
Se a CBF entender que a oferta corintiana é compatível com a situação do clube e único meio para que os pagamentos sejam honrados, os credores na CRND serão obrigados a aceitar a nova condição para receber seus valores.