Tiago Salazar e José Victor Ligero
São Paulo - SP
08/03/2017 09:05:20
 

O jeitão foge bem às características da maioria dos jogadores de futebol no Brasil. Grandalhão, até meio desengonçado, de fala mansa e sempre muito simpático, Jucilei prefere chamar atenção pelo o que faz dentro de campo. Pouco antes de atender a reportagem da Gazeta Esportiva logo após o treino dessa quarta, o jogador pediu para almoçar. “Mas, fiquem tranquilos, ele come em 15 minutos”, tranquilizou o assessor do atleta, que sem querer trouxe a lembrança da rotina de quem já trabalhou como servente de pedreiro antes de calçar chuteiras.

Sem descumprir com o prazo prometido, Jucilei chega sem pressa, cumprimenta a todos e se prepara para a sabatina. Nesse momento, mesmo sem subir o tom, o jogador se impõe por opiniões contundentes, convictas e não foge de nenhuma questão. Nem mesmo quando a abordagem é sobre a incerteza de seu futuro no clube, já que Vinicius Pinotti, diretor executivo de futebol do tricolor, admitiu a dificuldade em comprar o jogador após o período de empréstimo programado para vencer em janeiro de 2018.

“Jogador bom é jogador caro. Não tem jeito. O meio do futebol funciona assim. Se quer um jogador bom, tem que pagar”, avisa Jucilei, sem titubear.

Os chineses do Shandong Luneng têm contrato com o volante até junho de 2019 e a situação já preocupa o São Paulo pela boa performance apresentada por Jucilei em apenas 31 jogos pelo time. O reconhecimento da torcida, inclusive, já pode ser percebido no mesmo do anúncio da escalação, no Morumbi. “Não esperava”, admite o jogador, sem esconder a satisfação pessoal.

Para viver essa boa fase, Jucilei precisou driblar a desconfiança. Apesar da titularidade absoluta, vira e mexe o volante se depara com algum questionamento sobre seu peso e sua condição física. Assim que chegou ao São Paulo, o próprio atleta fez um trabalho especial para perder peso, porém, isso faz parte do passado, garante o jogador de 1,86m. “Se você não estiver bem, os caras te atropelam. Aqui no Brasil, se estiver mal fisicamente, você não rende”, lembra.

E esse rendimento independe da situação da equipe do Morumbi na tabela, afinal, o São Paulo briga para fugir do rebaixamento no Campeonato Brasileiro. Nada que impeça Jucilei de sonhar em disputar a Copa do Mundo da Rússia, por exemplo. “Eu tenho esperanças de ter uma convocação e quem sabe estar na Copa do Mundo. Tudo pode acontecer, só depende de mim”.

Hoje com 29 anos, Jucilei chegou a ser lembrado em 2010, quando Mano Menezes, com quem trabalhara no Corinthians, assumiu a Seleção. Uma proposta milionária do Anzhi, porém, levou a então promessa para a Rússia e frustrou quem já vislumbrava uma carreira gloriosa para Jucilei tanto no clube do Parque São Jorge quanto com a famosa amarelinha. Alguns anos depois, veio a transferência para o Al Jazira, dos Emirados Árabes Unidos, até o futebol chinês.
“Faria tudo do jeito que eu fiz. Não me arrependo de nada”, garante, mesmo tendo de se adaptar a discrepantes culturas. “Na China foi mais difícil, porque não falam inglês e outros idiomas. A comida, não preciso nem falar, porque todos sabem como é. Levei um cozinheiro para lá também”, revela, entre risos.

Nesta entrevista exclusiva à Gazeta Esportiva, o carioca “Juça”, como é conhecido entre amigos, ainda fala sobre Rogério Ceni como técnico, explica a vantagem de se ter um treinador mais experiente, como Dorival Júnior, e compara os rivais Corinthians e São Paulo.

Gazeta Esportiva – Desde que saiu do Brasil, você passou por Rússia, Emirados Árabes Unidos e China. No que você mudou como jogador e como pessoa após esse período?

Jucilei – Saí bem jovem, pude pegar bastante experiência lá fora. A vida nos traz experiência e ensina. Saí bem jovem do Corinthians. O passar dos anos me deu experiência e pude voltar com toda essa bagagem, me ajudando muito.

Gazeta Esportiva – Teve alguma situação fora do país que te trouxe algum aprendizado diferente?

Jucilei – O trabalho com alguns treinadores e auxiliares europeus. Isso auxilia muito. O modo de jogar é bem diferente, então, você pega essa experiência e traz para dentro de campo.

Gazeta Esportiva – Diante dessas diferentes culturas, você acabou passando por alguma situação curiosa?

Jucilei – Você sai daqui, que tem um clima quente, e vai para um lugar bem frio. Isso já muda muito. É uma grande diferença. Mas, a adaptação na Rússia foi até que rápida, mais do que eu esperava. Em questão de culinária, normalmente eu comia em restaurantes de comida europeia, então, não muda muito. Eu vivia em Moscou, não dificultava muito. Era mais o frio mesmo, mas me adaptei rápido.

E saí do frio indo para o quente, um clima bem quente nos Emirados Árabes, chegando a 50º C. Isso daí é bem diferente. A cultura deles a gente já sabe que é bem difícil, mas eu levei um cozinheiro para ficar na minha casa. Facilitou para mim na questão de alimentação.

Na China foi mais difícil, porque não falam inglês e outros idiomas. A comida não preciso nem falar, porque todos sabem como é. Levei um cozinheiro para lá também, para ajudar nessa questão. Me ajudou, mas realmente o lugar mais difícil de me adaptar foi a China.

Gazeta Esportiva – Experimentou alguma comida exótica na China?

Jucilei – Sem chance (risos). Não me arrisquei.

Gazeta Esportiva – Você enfrentou dificuldade com a parte física na volta ao Brasil. Agora, você já sente que chegou a sua plenitude?

Jucilei – Como falei em algumas entrevistas, ninguém desaprende a jogar futebol. A principal questão mesmo era a parte física. Fiquei mais dois meses de férias. Lá na China paramos no dia 31 de outubro. Novembro e dezembro sem jogar faz muita diferença. Estava mal fisicamente, cheguei aqui acima do peso. Mas, hoje posso falar que estou na minha forma física ideal. Não preciso mais intensificar os treinamentos físicos para entrar em forma. Estou jogando todos os jogos, como vocês têm visto, com uma intensidade muito alta.

Aqui no Brasil jogamos quarta e domingo, enquanto em outros países que joguei atuávamos mais de domingo somente. Por isso, somos muito exigidos aqui. Se você não estiver bem, os caras te atropelam. Aqui no Brasil, se estiver mal fisicamente, você não rende. Vejo que estou rendendo bem no time. Estou feliz por minhas atuações. Acredito que a torcida também esteja feliz. Fico bem grato pelo apoio da torcida sempre que entro em campo e procuro dar o meu melhor como forma de agradecimento à torcida, sempre.

Gazeta Esportiva – Falando nisso, você tem tido o nome cantado no Morumbi. Esperava esse reconhecimento rápido?

Jucilei – Não esperava. Como falei, procuro sempre dar o meu melhor. Saio de campo exausto sempre e aqui não vai ser diferente. Fico feliz pelo reconhecimento da torcida e espero sempre estar atuando bem para o São Paulo sempre vencer.

Gazeta Esportiva – Já se vê como ídolo da torcida?

Jucilei – Não, bem longe disso. Ainda não ganhei nada aqui. Espero continuar aqui no São Paulo e ser feliz, fazer uma passagem boa e conquistar títulos.

Gazeta Esportiva – Por que o Rogério Ceni não deu certo como técnico?

Jucilei – É uma pergunta difícil. O time não encaixou. A gente vê outros times grandes no Brasil não encaixando e acontece a troca. Somente para o treinador. Infelizmente, funciona assim. É diferente da Europa, que os técnicos têm mais tempo. Mas isso não depende de mim e nem do elenco. Depende da diretoria. A diretoria optou por mudar e eu respeito. Respeito também o Dorival, que chegou agora para nos ajudar. Mas, não deu certo. Quando o time encaixa, as coisas fluem naturalmente. Acredito que se o time encaixasse, não haveria essa mudança. No futebol vivemos de vitórias. Quando não acontece isso, vem as mudanças.

Gazeta Esportiva – Faltou habilidade para o Rogério Ceni no trato com os jogadores no dia a dia?

Jucilei – Pelo contrário. O Rogério Ceni também nos dava muita liberdade para falar, dar nossa opinião. Não tenho nada a falar do Rogério, só tenho a agradecer por confiar em mim, aceitar minha contratação. É um cara que não tem muita experiência no mercado como treinador, mas tem muito a aprender. Ele reconhece isso. Mas só com o tempo. Ele é um bom treinador e um ser humano fora de série.

Gazeta Esportiva – Qual é a grande diferença que vocês, jogadores percebem entre técnicos novatos e técnicos mais experientes?

Jucilei – Primeiramente, temos que respeitar o Rogério e o Dorival. Talvez um treinador mais experiente veja uma forma diferente de vencer uma partida, algo que um técnico mais novo talvez não consiga ver e ainda precise de tempo para enxergar isso. De fato, o Dorival tem mais experiência e o Rogério tem muito a aprender. Mas o trabalho do Rogério também era bom. Ele queria emplacar um modelo europeu e talvez não tenha dado certo por não terem vindo as vitórias. Se ele tivesse disputando na parte de cima da tabela, iriam falar que ele estava emplacando um estilo de jogo bem moderno no Brasil. Funciona assim. Mas, como não deu certo, cria-se uma dúvida.

Gazeta Esportiva – Você já teve que lutar contra o rebaixamento alguma vez?

Jucilei – Lá na China, ano passado, brigamos contra a queda. Estamos vivendo esse momento aqui agora, mas acreditamos que vamos sair dessa. Já começamos a reação, agora é manter.

Gazeta Esportiva – Imaginava brigar na parte de baixo da tabela quando acertou com o São Paulo?

Jucilei – A gente sempre vem para um clube grande pensando em títulos, mas não é o que está acontecendo nesse ano. Tivemos três eliminações que não eram esperadas. Futebol é assim, sabemos que não podemos bobear e precisamos sempre manter um nível alto. Não deu, esse ano está sendo bem difícil para nós, temos consciência disso. Agora, temos que brigar para sair dessa situação, e o próximo passo é pensar numa Libertadores.

Gazeta Esportiva – Até onde o São Paulo pode chegar nesse campeonato?

Jucilei – Nosso objetivo nesse momento é sair da zona de perigo. Depois que sair, é brigar pela Libertadores. O título ficou bem distante, mas a Libertadores está próxima. Primeiro passo é sair desta situação e depois brigar pela vaga.

Gazeta Esportiva – Você sonha em voltar à Seleção Brasileira?

Jucilei – Com certeza. Esse é um dos meus objetivos jogando em um grande clube do Brasil. Penso, sim. Por que não? Acredito que o Tite ainda vá olhar para o elenco da Copa do Mundo e eu tenho esperanças de ter uma convocação e, quem sabe, estar na Copa do Mundo. Tudo pode acontecer, só depende de mim.

Gazeta Esportiva – Você chegou à Seleção pouco antes de deixar o Corinthians, mas acabou ‘esquecido’ quando aceitou uma proposta milionária da Rússia. Hoje você agiria diferente?

Jucilei – Faria tudo do jeito que eu fiz. Não me arrependo de nada. Naquele momento a proposta financeira era boa para ambas as partes. Tomei a decisão de sair e não me arrependo. Seleção é consequência de um bom trabalho. Se você está fazendo um bom trabalho na China ou na Rússia, você será convocado. Claro que agora a visibilidade está bem maior do que à época que fui para a Rússia e para a China. O Giuliano está indo, o Gil, o Renato Augusto, o Paulinho. Futebol vai ser visto. É só alguém estar acompanhando lá. E acredito que o Tite esteja acompanhando o mundo tudo.

Gazeta Esportiva – Você planeja voltar para Europa, Ásia, ou prefere ficar no Brasil?

Jucilei – Depende muito da situação, da proposta. Não depende só de mim também, depende dos chineses, com quem tenho contrato. Se não chegar nada, no dia 13 de janeiro tenho que me apresentar lá. Tenho contrato com eles até junho de 2019. Então, isso depende muito. Estou fazendo um bom campeonato e espero ficar aqui no São Paulo.

Gazeta Esportiva – E como você recebeu a notícia de que dificilmente deve ficar por ser um jogador caro, como disse o diretor de futebol do São Paulo, Vinicius Pinotti?

Jucilei – Jogador bom é jogador caro. Não tem jeito. Qualquer diretoria do mundo sabe que se quer contratar um jogador bom, vai ter que pagar caro. Senão, você terá um jogador mediano para baixo. O meio do futebol funciona assim. Se quer um jogador bom, tem que pagar. Mas isso não vem ao caso. Eu acredito que o São Paulo vai se esforçar também para me contratar. E eu quero ficar. Mas não depende só de mim, depende do Shandong, do presidente e outras várias pessoas.

Gazeta Esportiva – Que comparação você faz entre Corinthians e São Paulo depois de jogar pelos dois times?

Jucilei – São duas grandes equipes, sem dúvida, que entram em competições para brigar por títulos. Tenho um carinho pelo Corinthians, foi o clube que me botou no futebol. Sou muito grato. Mas sou grato também ao São Paulo, por me receber de braços abertos aqui, comissão técnica, diretoria. Também pelo esforço para me contratar. Em relação a estrutura, o Corinthians também tem um CT maravilhoso, como é aqui no São Paulo. São duas equipes grandes, reconhecidas no mundo todo.